sexta-feira, 28 de maio de 2010

Ninguém mais é Kaspar Hauser

Não sei se acha assim também:
Mas as pessoas me enchem e me esvaziam o tempo todo!
Sem cansar. E cansando, tanto faz.
Gente me faz balão, outro dia me entapeta.
Gente que me varava de repente não sabe mais sair.

Não sei saber o que é meu, o que ficou que pulou do outro.
Faço mistura até sozinha sem falar em voz alta.

sábado, 15 de maio de 2010

7 anos...



essa semana reencontramos essa gravação de um dia lá em Rio Bonito de Cima em 2003.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

belezas são coisas acesas por dentro




se tá tudo dominado pelo amor, tudo bem
se tá tudo dominado, quer dizer drogado
então vai tudo pro além.

sexta-feira, 26 de março de 2010

uma questão de besouro

parece brincadeira.
escorregão.
esquenta voltar pra outro play.
uma música só.
dependuro num repete adolescente
no mesmo desejo
um lugar, outro, movimento
encontrar o que parece óbvio, enquanto ouço
recordo uma voz
alguma coisa que não conhecia,
num quase pra saber,
o quarto onde coloquei minhas coisas, depois da minha irmã ir morar em outro lugar
me tranquei num frasco da benzina
dentro do mesmo disco
fui embora

sensação de mobilete.
da bicicleta na descida da avenida Paraná.
de andar por horas de madrugada, depois da noite que bebi.
dormir na calçada ou na mesa de fora de casa.
da janela e o cigarro na parada do ônibus de viagem.
das duas mochilas que trouxe quando vim.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Tai

Esses tempos tenho enfiado tudo meu pra reestruturar minhas coisas. Acho demorado, me sinto presa, fico frustada de não por tito no bico e bater meu braço pra algum lugar.
Mas você me lembra por onde mais dá pra bater, pude ir.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Inda de lambuja o carneirinho

De volta da rua, comida na sala, criança no fogo.
Um restinho de luz atropelada pela multidão de nuvem preta urrando tragédia.
Cueca vermelha molhada porque está aprendendo avisar (depois).
- Bainho rápido, vai acabar a luz.

Escapo rapidinho pros 7, 13 anos.

No barulho de nuvem nervosa, chinelo de borracha pro pé de todo mundo, toda tomada desconectava.
- Vamos pegar o carro! A gente corre pra uma cidade sem chuva, espera, volta depois...
Não entendia, mesmo, porque o riso (tenso) da minha mãe não se mexia.

Foi assim depois do Nabor.

Nossa casa ficava numa praça, na frente dela. Do outro lado, mais pra cima, a dele.
Umas coisas eram previstas lá em casa.
Que raio caia em casas, e diabetes em quem comesse muito doce.

Meu irmão ficou ruim, ficou no hospital.
Vivia lá.
Dessa vez não sabiam que era.
Uma suspeita, depois confirmou. - Diabetes.
Minha cara toda mexeu.
Sempre disseram, até ali eram só meus pais.

Diabetes.
Falaram. Antes, depois.

Numa noite, depois disso, a gente acordou de madrugada num clarão do outro lado da praça.
Fogo do tamanho que não conhecia.
Fomos lá mãe, pai, três moleques.
Estavam na praça, em cima dela, a mãe, o pai, dois moleques.
De pijama.
Um moleque machucado, a mãe jogou da janela pra ele não queimar.
Foi a geladeira.
Um raio na geladeira.

Talvez meus pais tenham dito coisas que não aconteceram, lembro só do raio e do diabetes.

A vizinhança levou café, biscoito, pão, roupa.
Formidável que as coisas aconteçam.
E na madrugada.
Pra criança, um presente.
Madrugar na grama da praça. A casa no fogo. Vizinhança. História de medo. Café, leite, toddy, pão, biscoito.
Vivi aquele raio todas as noites depois.
Até que umas semanas depois, pai, mãe e um dos moleques morreu de carro na estrada.
Foi difícil dormir.

Dois medos me travavam as pernas: chuva e espírito.
Gente que morria era espírito.

O medo da chuva passou depois que meu irmão disse que a luz vinha antes do som.
Via o clarão, via que nada queimava, sabia do barulho antes dele me pegar.
A gente sentou pra comer, já tudo escuro.
Disse antes de acabar a luz, que ia acabar.

Faltava comer, escovar dente, mamar pra dormir.
Nada de vela.
Acabou.

Medo do estrago que ia saber dia depois.
Pensei rápido sobre o pé no chão.
A janela parecia querer quebrar.

Meu pai nunca teve medo.
Minha mãe ia de um lado pro outro, rezava, dizia Minha Nossa.
Podia, tinha lá meu pai.

De pé no chão, molhei o braço dele na janela.
Deitamos no calor.
Fazendo como normal.

Sem tv as pessoas falam mais.
Sem ventilador ouve mais.
Expliquei outro dia que o barulho é o vizinho, não o lobo.
Acordou gritando: medo, medo. Medo do vizinho.

Achei melhor cantar.

Não dormia nunca.
Dissemos o nome de todas as pessoas que a gente lembrou.
Mais cantoria.
Não aguentava mais, virou pro lado de lá, parou de procurar meu braço com a mão.

A vizinha gargalhou.
Abriu o olho, virou rápido pro lado que eu tava, não disse.
A gente sabia: a bruxa...

quinta-feira, 11 de março de 2010

perguntaram pra ele:

Tito, que cê vai ser quando crescer?
- menino.

segunda-feira, 8 de março de 2010

acho que aqui é sacolé

Tinha 14 anos no primeiro trabalho.
Auxiliar de auxiliar de creche.
Recebia nada, fora o cheiro que lembrei hoje.
A Débora que começou.
Era 1ª auxiliar.
Todo mundo adorava.
Todo mundo da creche e fora de lá.
Linda, linda.
Nunca tinha visto aquilo.
Chegou na escola com 14 anos.
Andava com a bunda pra trás, perna distante da outra.
Cabelo preto-preto, enrolado de bola, pele branca-anca sem risco nenhum e a boca vermelha.
Foi uma semana.
Uma semana pra toda boca de menina ser vermelha, bunda empinada e perna distante da outra pra andar.
Não tinha mais chance nenhuma, ninguém existia fora a Débora na oitava série.
Fazia tudo do jeito que a gente queria fazer.
E jogava bem volei que toda a gente treinava.
Ainda isso.
Com um metro e pouquíssimo.
Peito, bunda, perna, barriga não.
As crianças enlouqueceram.
As professoras, diretoras.
Da escola e da creche.
Me apresentava quase todo dia, ninguém lembrava.
As crianças não riam nem tentavam meu colo.
A professora pra não dispensar funcionária que não custa, pedia pra buscar papel, tinta, chamar alguém.
Pros meus pais era bonitinho ver subir na bicicleta depois da escola dizendo ir trabalhar.

Lembrei que não.
Não foi o primeiro não.
Com 11 até 13 fiz geladinho pra vender.
Com a Paty.
Com y.
Fazia na casa dela, com aquele suco em pó baratinho, esqueci o nome.
Ki Suco. Lembrei.
Depois ia de casa em casa com isopor.

Teve a loja que a gente montou.
Nessa idade também.
Toda coisa que a gente não gostava mais, a loja vendia.
O ponto não era tão bom.

Um pouco antes, a gente montava cabana na rua.
Cobrava ingresso da molecada e apresentava peça de teatro.
Já lá dentro da cabana, depois da venda de ingresso, a gente avisava às vezes que não ia ter apresentação aquele dia.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

precinescessário

Nunca dinheiro foi, pra gente, questão pra ter ou não ter filho.
Pra se ter filho não precisa de quase nada.
Ainda mais pequeninho-inho, que acaba de chegar.
Cabe em qualquer lugar, come peito até bem adiante.
Fralda vem de todo lugar.

Vou corrigir uma coisa.
Alguém precisa ter, a mãe e o pai não.
Os filhos que vieram antes doam coisas incríveis: móveis, roupas, brinquedos - fundamentais.
Incrível, como funciona!

Quando começa a ver que precisa comprar short, Marina vem com a sacola exatamente de short que no Guel apertou. Percebe que uma sandália só não tá dando, Mariana entrega a do tamanho ideal que não entra no João. Depois da festa do amigo de três, descobre um mundo que anda, acende, monta, conversa. Dia seguinte vem Leon e Fernanda trazer a gente e uma mala dessas que faz a bagunça variar melhor.

Corrigir pouco mais:
Algum precisa.
Bem menos que se fala por aí.

Tem o dinheiro da escola, pra escola, esse dinheiro é grande.
Mas uma tal falta de dinheiro que não miserável faz fazer o que a gente paga, inventar.

Mas vou falar o que vim falar.
O que realmente falta e sufoca é contar do barco e não sair cinco da manhã num passeio n'água.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

às vezes Bukowsko

Volta de uma Ida Carnaval, acompanhada do roxo, rasgo, e da pele do dedo que pendurou.
A carona facilita o que sempre transtorna.
Talvez cansada, deu beijo e abanou antes de chegar.
Vejo o ônibus que demora mais à noite, mais no feriado, passando longe de mim, no feriado à noite.
Aproveito o boteco, peço um salgado, assado.
Nele (no boteco, não no salgado), uns moços, desses que não agradam.
Em bando.
A voz firme de quem fez faculdade e um filho.
Estico pra pegar a mostarda, um desses me ajudam, agradeço sem olhar.
Como tudo, salvo o papel que dou pro cesto já vomitado.
Vou andando numa saia de dois palmos e numa blusa vermelha que abre pra mostrar a coluna. Uma flor na cabeça me diz que bebi. O sutiã vermelho aparece e some na meia blusa.
Sigo o caminho que pode me trazer um ônibus.
Vou dando boa noite pros moços na rua, no escuro.
Agora devem dormir.
Devo ser a última que não parei.
Ali do lado de lá vejo um cachorro grande.
Olhando bem, parece um porco.
Comendo saco de lixo.
Um cachorro fazendo graça, óinc.
Os outros sem fantasia.
Percebeu que eu vi, vi o rabo, olhou a flor e parou o olho nela.
Viu o aberto da blusa, talvez o sutiã vermelho, e quase certo o short que não era pra ver embaixo da saia que erguia e voltava enquanto eu corria daquela fantasia.
À frente uma gente.
Um sorriso de cá besta de quem pede desculpa do ridículo.
Volto andar, de imediato.
Quase vejo a casa, a minha.
Dois meninos de treze anos me olham com cara de 32.
Cumprimento com voz de quem separou e trabalha com arte.
Sinto que a vida funciona quando ele abre o portão pra eu entrar.
Boa noite!
Salva.
Finalmente.
Tem ainda ela ali.
Um boa noite só, o último.
Ela tem olho de porco.
Não corro.
Pode ter gente ali.
- Boa N..
- Como é que eu faço pra falar com o Juan?
- ...não conheço.
- Do bloco 8.
- Não sei.
- Vem comigo.
Sai na minha frente, um pouco pro lado, um pouco pro outro.
Eu vou, não pelo Juan, continuo onde ia.
Virei onde ela não ia - Boa noite!
Era o último.
Não esqueci, nem perdi a chave de casa.
Consegui.
Não acendo a luz.
O Juan.
Banho-banho.
Suco de fruta natural.
Mania de agora.
Abacaxi com hortelã.
Sem açúcar que é pra valer.
Sentar.
Santo Deus.

Interfone!

Corro como se meu filho não estivesse em viagem.
- A Mila está aí?
- Quem é Mila?
continuo:
- Quem fala?
- É a Mirian.
- Que Mirian? Que Mirian?
- Do bloco 1.
- Não conheço, ninguém, nenhum nome, nada, nada.
- Desculpa, boa noite.
O último.
O pufe.
O suco.
Escovar o dente, ahhh.

Toca de novo!
De novo!
Que há?

- A Mila está aí?
- Que tá havendo, não tô entendendo, a segunda vez que me perguntam dela aqui, quem é essa?
- Minha mãe. O porteiro deu seu nome e apartamento.

Ódio.

- Sua mãe é uma que estava aqui no prédio, ali fora agora (com olho de porco)?
- Sim, ela.
- Eu não a conheço, só cumprimentei. Está tudo bem?
- Olha, desculpe, desculpe.

Numa vergonha de passarinho.

- Olha, não se preocupe comigo, qualquer coisa que precisar, pode me chamar.
- Desculpe, mesmo. Boa noite.
- Olha...
- Ãhn?
- ...fiquei com a impressão dela pular no Bloco Oito...

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

por minha cabeça não passava

umas coisas ando vendo que meu filho escuta:
filho, chupa o sorvete senão acaba...

Anda na carência do filho que dorme com a mãe na mesma cama.
E que descobriu lobo mau, a bruxa e o fantasma.

A gente correu prum festival de teatro de animação.
Lá uns argentinos, uns bonecos e umas gracinhas bilingues.
Legal.
Chega um fantasma.
Com mais ou menos dez centímetros e alguns metros pra lá.
Cada vez que aparece um susto, pulo e abraço de corpo todo.
Achei uma bobagem o início disso.
Mas lembrei a grandeza.
A morte e o sinistro e as figuras.

Ficou bonito depois que pensei.

Hoje me pede a cada meia hora.
Dormindo já.
Lembrei que depois de casada já (e ainda), depois do pesadelo acordava Lipe e pedia que ficasse acordado até eu dormir.

Segunda decidi não ir à escola.
Levar.
Não tinha nada sério pra fazer, ficamos juntos.
A casa um lixo do fim de semana.

Lá por quatro da tarde, sem sono e muita excitação, não vinha sorriso nenhum. Não me vinha sorriso nenhum.

Martelava a imagem da cozinha de louça na pia, o chão esfarelado e as bolas pretas, o cabelo no ralo do banheiro.

E a voz e o tom mais lindo: desenhar, mamãe, vamos?

Dizendo com raiva de quem TEM que dizer: Não, filho, mamãe não consegue desenhar agora.

Pedi que desenhasse sozinho e mostrasse enquanto limpasse a cozinha.
Bom como é, fez.

Nossa, outra coisa.
Quase tudo mudou.
Quase tudo mesmo, tudo, tudo, quase tudo.
Faltava o pano na sala.

Senta ali no quarto com o quebra cabeça, só enquanto passo aqui.
Santo, santo, senta e mexe nas peças que nem sabe encaixar.

Pano, pano.
Não gosto deles.
Deu e muito bem vindo.

Incrível o riso.
O prazer do filho de volta.
Da gente ali só a gente.
Da bagunça sem sujeira.
Do espaço.
Da sensação de capaz.
Da vontade de recortar.
Lindo.
Nossa, lindo. Delicioso.

Mas ia falar de outra coisa...

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

um dia na vida dessas pessoas cujas histórias se cruzam por coincidência.

Entrei no banho pra preparar, lavei tudo que alcanço.
Desodorante, roupa bonitinha, retoque na bagunça do cabelo, ajeitar coisas, anotar, pastinhas, papéis, enfiar na bolsa.
Pagar conta.

Excitação.

Bora, bora e não dá pra almoçar.
Itaú tudo rápido.
Monopolizo a caixa 20 minutos.

Caixa Econômica.
Tremo de entrar lá.
Fila pra pegar segunda via.
Fila pra pegar segunda via!
Uma moça simpática que tá lá.
Simpática mas uma só.
Vai indo.
Meu olho deu pra tremer.
Uma vez meu irmão, numa hora assim de olho tremido, fez exame de glicemia em mim, era hipo.

Entra ali no atendimento uma menina.
Cara de novinha.
Cabelo liso, preto, enorme.
Sombra, blush, um batonzinho.
Olho verde, dente e pele branca.
Magra.
Brinco, pulseira, colar de pérola, anéis.
Não sei tirar o olho dela.
Nada sem enfeite.
Exageradíssima.
E linda.
Senta no lugar da outra.
Por que se tem lugar do lado?
A outra despede.

Sombrancelha pra cima e pra baixo, boca aberta, apertada, bico.
Sabe que todo mundo só sabe olhar ela.

Uma mulher cheia de criança pede prioridade.
Resmungos dos 50 minutos da espera.
Outra com barrigão.
E o pessoal.

Converso com gerente: mais atendente!
Não tem, diz simpático.

A que acompanha a grávida fala que é mãe dela, acho mentira, não sei porque mentir sobre isso.
Raivosa no ouvido da filha:

Tem direito.
Eu processo isso aqui.
Trabalho com advocacia.
É lei.
(...) barraqueira.

E repete.
E repete.

Não acaba nunca o atendimento da pessoa antes dela.

Repete.

E eu sem ficar quieta: Faz mais mal isso que se ela esperasse...
E claro:

Primeiro, não falei com você.
Segundo que é lei e ela tem direito.
E não tem que ninguém olhar feio.
E se ela não for atendida eu processo isso aqui.
Trabalho com advocacia, conheço.

Aos berros.
Pronta pra me bater.

Sabendo da minha incompetência com briga, sorriso de mãe: Vai ser atendida, vai ser atendida, mas vai, vai sim, sim, vai ser atendida.

Silêncio.
Atendidas.
Fofoca depois.

Minha vez e ela, a Carol, cabelo preto-preto, pele branca-branca, não tem senha pra segunda via. Não tem senha pra segunda via!
1:50 minutos depois.
Bonita e bem humorada me encaminha.
Rio também.
Bonita.
Bem humorada.
De novo o gerente.
Não tem senha!

Pede pro moço bonito que parece inteligente tirar lá em cima.
Peço pra esperar na fila, levanta o dedão, vai e volta com a segunda via que da próxima vez falo com ele antes da Carol.

Duas horas e vinte.

O gerente me viu: Tadinha...

Entro no ônibus sem ar condicionado.
64 graus.
De repente, sem preparo, e o sol amarelo que nem pisca:
Uma chuva de sapo.
Se não foi, esqueceram os sapos.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

e quem é que sabe a palavra que é

Depois de um dia de churrasco que nunca como e bebo demais, cheguei e deitei dentro da roupa que vim.
Era cedo.
Bom porque era cedo que tinha que acordar também.
Meia noite abri o olho.
Vim, olhei a hora e voltei pra cama dormir.
Não dormi.
Voltei pra cá.
Voltei de novo depois. Pra lá.
Não tenho nunca isso de acordar depois de dormir.
Tenho sempre na verdade, até hoje todos os dias. Mas não assim de madrugada.
E detesto.
Uma vez que foi assim, depois de anos sem insônia, acordei de madrugada, não conseguia mais dormir de jeito nenhum. Levei meu colchão pra sala. Sentia uma coisa estranha no corpo. Na sala também não dormi. Voltei pro quarto. Lá em Curitiba ainda. Então de novo peguei no sono, já quase amanhecendo. Minutos depois minha mãe liga. Era a notícia que meu pai tinha morrido.
Ontem fiquei nesse medo do telefone.
Tanta gente pode morrer.
O do vizinho tocou, 5:25hs.
Fiquei na agonia que Tito não estava, sensação de culpa fortíssima, de ausência, negligência, descaso. Quase liguei três da manhã pra perguntar se todo mundo lá respirava.
Fui escrever no caderninho que faço pra ele desde que nasceu.
Voltei a dormir seis, seis e pouco.
Acordei nove, era pra acordar antes.
Liguei pra Lipe e pedi que não levasse Tito pra escola, que eu estava indo pra lá.
Disse pra mim que precisava descansar um pouco, que Tito acordou uma da manhã e voltou a dormir às seis.

domingo, 31 de janeiro de 2010

besta é tu, besta é tu

O carioca tem mesmo que ser o brasileiro que todo o mundo conhece e vê na tevê.
Gente protagonista que é.
Quase vomito na festa que bate quando Rio.
Na van com laço rosa na cabeça, seus sessenta e a companhia da mãe, provável, que não estranha o laço na cor máxima. Diz da "gringaiada" que a cidade aloca.
Alto e rasgado vira pra trás perguntando se só gringo tem ali. Reconhece e alivia: ahhh, só carioca...eu, que há nove anos, convivo com o inglês que se fala com quem o sol não pega e o reconhecimento do erre que não consegui rasgar, comemoro enfim o direito de ser um deles. Mas então o olho volta rápido e me aponta: ahhh, tem uma ali...
Nunca, nunca o carioca se engana.
Cor, salto e espalhamento.
Pode ser que não digna de "aahhh, só carioca", aprendi a me espalhar, me reconheci na esparramação e no espaço de rir alto sem constranger e acabar o riso.
De qualquer forma me sinto em preto e branco no vermelho carioca da unha do pé ao cabelo amarelo ainda que seja preto.
Me desleixo no excesso de roupa que carioca não engole, nem deixa de comentar.
Me culpo detestar o sol que faz brilho no Cristo que vê.
Constrangimento na pouca ida à areia que mostra que o Rio é mesmo mar.

Quando criança pedia pra minha mãe falar francês pra eu dormir.
Não conhecia ainda o erre e o x do esse que embala querendo que o ouvido não feche.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

seja o tempo que for

Faz dois anos, ou tanto mais já não tendo como precisar onde é que começa.
Talvez isso mude mas só posso no já, dizer que não tem idade o filho que se tem.
Que muito dele vai mudar, muito nosso talvez, mas que nessa quase inexistência mais perto do que se data inexistente, é a existência inteira.
Uns dias fazem mudança proporcional ao tempo que o olho vê. Como quem conheci aos 23 e reencontro aos 30.
Esse corpo que se tropeça se não cuidar, é um todo de alguém.
Conheço e reconheço todos os dias.
A beleza que nunca mais em lugar nenhum, e que indigna um olho que deixa passar.
Riso de fazer chorar de rir e do que é demais.
E sinais de tantos anos, pessoas e lugares e também de ninguém nem nada que não seja ali.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Invadiu minha casa

A foto guardada, festival de música que não vi, a Clarice, a Gal de 2 e 2, a dança dele com o braço erguido pra trás que parece pássaro e é, o olho pra dentro pra enxergar a sensação nova na pele, rio em janeiro, cobrir o corpo pra dormir, estrada, carro, criança, cachorro, prazer, idéia escrita, conversada, em imagem e pra escutar, abandonar e ver que segue, mudar ontem imutável, fazer com medo pra encorajar, paciência no que rasga, agradecer, voltar atrás pra aproximar, concluir pro espaço de outra coisa, querer não parar, Cassavetes, (re)perceber o que sempre faz, gosto da mudança, reencontrar e querer perto, pão manteiga e chapa, cerveja sem ter que acordar cedo, convite de viagem, carinho e piada onde pesou, cerveja tendo que acordar cedo, Novos Baianos, rede pra balançar, não saber nada do que vem, ter as pessoas sem que elas saibam, gostar do que foi e como vem agora, visita sem combinar, esquecer da morte, bloco de carnaval.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Retrô

Queria um texto especial pra falar do que foi 2009 por aqui.
Não consigo.
Vai passar da hora (se já não passou) e só barata chega pra mim.

Atrás de solução, vasculhei o histórico das mensagens e descobri rascunhos de palavras, frases, diálogos salvos pelo blog que não publiquei e pensava ter descartado.
Além disso fiz uma seleção de textos que me mexeram ou fiz mexida, ali na barra lateral, em ordem cronológica.
Então!


Ele disse que na frente, na lateral esquerda da frente, tá excedendo o tamanho.


MULHER BOMBA
Vídeos capturados, casa um caos, seleção de música, marido doente, filho com sono, projeto que não fiz, dinheiro que não recebi. Silêncio!


Eu não vou postar essa bobagem.


Difícil que são dois.
Um dá consistência.
Um me joga por aí.


- Não entendo pessoas que por acaso nao se apaixonam por você.
- Doendo como se tivesse apanhado.
- Mas que bom que você vai, mesmo sabendo que tem volta.
- Distraída.
- Como diz Clarice, "chega a sair sangue".


Minha música não faz trilha
Mas tem cena aí, algumas.


Hoje quando acordei encontrei ontem espalhado na casa.


- Precisamos marcar para colocar a conversa em dia.
- Sim, precisamos.
- Faz algum tempo que eu não te leio.
- Entendo.
- Vou colocar a leitura em dia, os últimos poemas que eu li estavam lindos.
- Fico contente que goste.
- Você é nossa Clarice Lispector do cinema, é como dizia Sartre, quando escolhemos nos reconhecemos na humanidade inteira. Sua foto não está aparecendo.
- E agora?
- Ah... linda. E você tem ido ao teatro? faz tempo que eu não vou, nós podíamos marcar de ver uma peça.
- Fui hoje.
- Toda vez que eu me lembro de ti penso na música do chico, Beatriz.
- Ex, ex-atriz.
- Pathos atriz.
- Não quero nada com os patos.
- Não tem como fugir ao pathos.


Na praticidade de cozinhar em minutos, nunca me coube espaço pra entender gente que cai.
Conversa com amigos era reduzir suas coisas.
E sei agora que nem escutar podiam.
Não me admitir foi sempre o exercício de atrasar a me ver.
Imutável. Até mudar.
Mas vou dizer: me sei pouco além do que soube.
Parte da trajetória de não trajetar.
Que trajeta.
Ir como não quer.
E vai.


a gente inventa uma quantidade de coisas pra viver enquanto não ama amado
daquele jeito em cada um de um jeito e o jeito um jeito mesmo em todo mundo.


matou ela em slêncio.
como alguém que asfixia o bebê que dormia.
nem som de sapato no chão ouvi.
outra luz acabou.
um sapato ou vassoura, uma luz que escurece.


Tem gente que me faz saber não saber fazer.


1 ANO E 7 MESES
BORA que eu quero correr, SUBIR na velocidade que vi aquele CARRO sair. CAIR, ficar de ponta-cabeça de MÃO no chão. Sentir sacudir BANANA, MAMÃOm, PÃOm no BARRIGÃO e COCÔ, PUM, olha COCÓ que LEGAL! MAMÃE convida: Quer tomar BANHO, xuxu?


Houve um Natal que a gente pôde caprichar.
Minha irmã um aparelho 3 em 1 - Rádio, fita e disco.
Conhecia tudo de música.
Meu irmão um fliperama.
Preenchia a sala, a varanda.
Eu uma Bilu-Bilu.

Não quero explicar o que é.



sábado, 2 de janeiro de 2010

eu sei que você fez os seus castelos

01º/01/10, veio pra gente a esperança.
Já de noite.
De algum jeito entrou, nós dois vimos.

Apesar de detestar barulho que asa faz, comovente ela ali, no dia tal.
Disfarcei o terror pra ele não aprender esse medo desajeitado.
Carreguei pro quarto como se com interesse em dormir.

De manhã, sempre cedo demais.
Acordo num beijo no braço.
Demais também.
Enrolando na cama, a gente troca os lados, tenta acordar.

Será que nosso bicho tá lá?
Rio fingindo.

Corre pra ver.
Funciona!

Controlo agonia, lembro sempre do meu irmão que disse da adrenalina atrair inseto.
Não sei se ignorância, sabedoria ou sacanagem.
Só caçulo.

Adrenalina pelo bicho, adrenalina pelo medo da adrenalina.

Asa não tinha.
Ouço asa no preparo pro vôo.
Fomos pro chão, olhando bem e pronta pra correr.

Ali!

Encontro com entusiasmo pra enganar filho e adrenalina.

Quietinha no chão.
Num canto.
Comemos ali do lado.
Massinha, desenho, filme.
Estranho.
Ontem voava mais que pousava.
Cheguei mais perto.
Adrenalina nenhuma.
Fui gostando da esperança assim.

Tinha uma perna pra cima.
Andava lenta.

O ventilador ficou ligado a noite, porque dormi sem saber.
Bateu.
Não voava mais.

Passou o dia andando ali, devagar.
A perna levantada caiu.
Colocamos ela pra fora, achando que podia ficar melhor.
Mas não sei se ficou.

A perna ficou em casa.
Sobe e desce a parede.
Pra formiga, uma perna de esperança é demais.

Fechava assim.

Vou atrás do mouse levar a seta pra onde clica e faz o texto público.
Olho de volta pra frente e, em cima de onde faz o texto público, a maior barata que vi em 31 anos e 11 meses e meio. Grosseira, marrom marrom, cascas, várias cascas, muitas, muitas cascas, duas antenas caem e levantam num contrabalanço que sustenta aquele comprimento estúpido.
Faz graça, cospe em mim.
Voa.

Não bate no ventilador.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

último gole ao ano das quedas (e erguidas)

Um beijo enorme a cada um que de alguma forma me acompanhou e ajudou a de novo estar simples, leve e boba.
Ano lindo a todos!

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

seja rico, seja pobre

Durante todo o dia, vejo as coisas e escrevo, escrevo sem sentar e escrever, faço texto e idéia sobre o que vejo enquanto vejo.
Tenho tido momentos muito fortes com meu filho, de tremer, de gargalhar de boca aberta e todos os dentes até chorar com som de risada.
Quero registrar de alguma forma, materializar essas sensações, chegar de algum jeito onde chegam em mim.
Mas entendi.
Não chego.
Não vou chegar.
Em pé não.

Fumante não senta mais.
Muita área livre.

Mas gente, não se pode fazer assim, pode?
Quando vai mudar a mão de uma rua, precisa outra opção pra então mudar.
Uma obra na rua faz com que outro trajeto funcione enquanto ali não.

Como é que um lugar que não tem banco de rua, nem cesto de lixo e só tem falta de praça pode fazer assim?

E vai te fazendo acreditar.
Tava almoçando com Tito naquele lugar em frente ao Campo São Bento, onde se bebe cerveja, fuma. Cadeira na calçada. Os fumantes com cadeiras pra lá do toldo. E veio fumaça na gente. Olhei pra lá na hora. Nervoso, pediu desculpa, de jeito vira-lata, foi indo mais longe. Eu não consegui mudar, dizer que eu queria que ele voltasse, que não fizesse assim.

E como é que não tem a opção de um lugar ser só de fumante?
Como é que não?

Mulher. Pedestre. Fumante.
Pra onde é que eu quero ir?
Só posso ir.

Quando é que eu posso parar?
Sentar, acender um cigarrinho, tomar um negocinho?